FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS - UNIFENAS-BH
JOÃO MAXIMIANO
INCONTINÊNCIA URINÁRIA
Revisão
do mecanismo da micção
A
urina é drenada dos rins para a bexiga pelos ureteres que desembocam no ângulo superior
do trígono. A bexiga é envolvida pelo músculo detrussor que será responsável
por aumentar a pressão no interior do órgão levando à expulsão da bexiga. O
controle da micção pode ser: 1) involuntário (reflexo medular) ou 2) voluntário
(controle pontino).
O
aumento do volume da bexiga leva à sua distensão enviando sinais sensoriais ao
plexo sacral através dos nervos pudendos. Sinais eferentes da medula retornam à
bexiga pelos nervos parassimpáticos causando à contração do músculo liso detrussor
levando à micção.
Caso
o indivíduo deseje não urinar um sinal voluntário pode agir sobre o esfíncter
externo da bexiga (músculo esquelético voluntário) impedindo a passagem da
urina.
De
modo, antagônico se o indivíduo quiser urinar mesmo estando com a bexiga
parcialmente cheia, ou seja, desprovida do reflexo da micção, sinais de centros
superiores podem promover a contração de músculos abdominais aumentando a
pressão intrabdominal e consequentemente a pressão vesical proporcionando a
micção.
Simpático
X parassimpático: a inervação simpática da bexiga
origina-se do segmento medular T11-L2, de onde fibras eferentes cruzam a cadeia
simpática paravertebral, e prosseguem pelos nervos esplâncnicos lombares até o
plexo hipogástrico. Neste local, fazem sinapses com neurônios pós-ganglionares
e daí se dirigem para inervar a região do corpo vesical, do trígono, do
esfíncter interno até os meatos uretrais. No corpo vesical onde os receptores
beta-2 são abundantes a excitação do simpático provoca relaxamento. Na base,
onde predominam receptores alfa-1 o simpático provoca contração do colo vesical
e da uretra. Quando o volume vesical
alcança de 150 a 300ml o simpático é inibido enquanto o parassimpático é
estimulado provocando contração do detrussor e expulsão da urina.
Segmentos
superiores do SNC: duas regiões dos centros superiores tem
papel notável no controle da micção, são elas: 1) ponte e 2) face lateral do
giro pré-central do córtex.
·
Ponte:
centro
pontino da micção (CPM) tem ação facilitadora sobre a micção e o centro pontino
esfincteriano (CPE) age sobre a continência.
·
Giro
pré-central: exerce ação inibitória sobre o músculo
detrussor.
Obs. Os núcleos da base,
cerebelo e hipotálamo também exercem algum efeito sobre a micção.
Envelhecimento do aparelho urinário
1)
Modificações
morfológicas
·
O rim sofre modificação de seu peso que de
230 a 250g na vida adulta passa a pesar 180g.
·
Os vasos renais sofrem progressiva esclerose diminuindo
o fluxo laminar do sangue.
·
O numero de glomérulos reduz significadamente
comprometendo a filtração glomerular.
·
Os túbulos renais sofrem um processo de
atrofia decorrente da isquemia.
·
Os ureteres apresentam maior
contratilidade decorrente da expansão de
sua camada muscular em relação à outras camadas desse órgão.
·
Alterações do envelhecimento da bexiga são
representadas pela deposição de colágeno, com pronunciadas alterações
histológicas observadas sobre microscopia eletrônica nas três camadas do
detrussor e consequente hiperatividade do mesmo, e pela progressiva esclerose
dos vaso-vasorum, cuja consequência é a denervação da bexiga.
·
Redução da capacidade da bexiga
·
Aumento do volume residual
·
Alterações encefálicas podem também
repercutir em alterações na bexiga.
·
A queda do estrogênio também está relacionada
ao envelhecimento da bexiga.
·
Nas mulheres a uretra tem uma diminuição da
pressão uretral máxima e do comprimento funcional.
·
Aumento da próstata
·
Aumento da produção noturna de urina
·
Aumento da incidência de infecções
decorrentes.
Na
bexiga
|
- redução da capacidade
|
- hiperatividade e redução da contratilidade do detrussor
|
-aumento do volume residual
|
Na
uretra
|
-redução da pressão de fechamento uretral
|
Na
próstata
|
-Aumento do volume
|
No
geral
|
-
Aumento na produção da urina noturna
|
-
redução na síntese estrogênica nas mulheres
|
Incontinência urinária
Conceito: é
definida pela Sociedade Americana de Continência como “perda involuntária de
urina”. Na população geriátrica, apresenta-se como síndrome de etiologia
multifatorial, resultante da interação de fatores do envelhecimento com lesões
do sistema nervoso e urinário, com comorbidades, uso de medicamentos e declínio
funcional e cognitivo.
Epidemiologia: a
prevalência é maior em idosas mulheres. É responsável por elevada morbidade
(candidiase perineal, celulite, ulceras de pressão, infecções do trato
urinário, urosépsis, quedas, fraturas e interrupção do sono); também reduz a
autoestima do indivíduo e o conduz a isolamento social e depressão. Alem disso,
sobrecarrega familiares e cuidadores, e predispões ao risco de internações em
instituições de longa permanência.
Classificação da incontinência urinária
Tipo
|
Subtipo
|
Transitória (reversível)
|
XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX
|
Estabelecida (persistente)
|
Urgência
|
Esforço
|
|
Transbordamento
|
|
Mista
|
a)
Transitória
ou reversível: caracterizada pela perda involuntária de
urina na ausência de disfunção do trato urinário inferior. É provocada por
eventos clínicos agudos, potencialmente reversíveis.
Causas de
incontinência urinária transitória (potencialmente reversíveis)
|
- Delirium
|
- Infecções do trato urinário
|
-uretrite
e vaginites atróficas
|
-restrição
da mobilidade
|
-aumento
do débito urinário
|
-medicamentos
|
-impactação
fecal
|
-distúrbios
psíquicos
|
b)
Estabelecida
ou persistente: refere-se à variedade não causada por
comorbidades clínicas ou efeito colateral de medicamentos, que persiste ao
longo do tempo. Relaciona-se aos seguintes mecanismos fisiopatológicos:
Ø Hiperatividade
ou hipoatividade do m. detrussor.
Ø Alterações
da pressão uretral
Ø Obstrução
da saída vesical
Ø Distúrbios
funcionais
b.1)
Incontinência de urgência: é a mais comum entre ambos os sexos.
Caracteriza-se por enorme desejo por urinar seguido de perda involuntária de
urina que pode ser de moderado à grande. É desencadeada pela hiperatividade do
detrussor que pode vir acompanhada ou não de deficiência na contratilidade.
Quando ocorrer hiperatividade do detrussor com redução da contratilidade
ocorrerá manifestações como: urgência, frequência, jato urinário fraco e grande
volume residual, sintomas que se confundem com obstrução mecânica do trato urinário
e que podem ser diferenciados pela urodinâmica.
b.2) Incontinência de esforço: é o mais
comum em mulheres jovens, e o segundo mais comum em idosas. Ocorre quando
aumentos na pressão intrabdominal superam a pressão de fechamento
esfincteriano, na ausência de contrações vesicais. Na mulher é causada por: 1)
deslocamento da uretra de sua posição anatômica durante esforço
(hipermotilidade uretral) ou 2) por
deficiência esfincteriana intrínseca. No homem ocorre por deficiência
esfincteriana, consequência de lesão causada por prostatectomia radical.
b.3)
Incontinência por transbordamento (hiperfluxo): quadro
de gotejamento ou perda contínua de urina associada à esvaziamento vesical incompletos,
jato urinário fraco, esforço miccional, intermitência, hesitação, frequência e
noctúria. É provocada por dois mecanismos distintos: 1) hipocontratilidade do
detrussor e 2) obstrução da saída vesical. A primeira decorre principalmente do
hipoestrogenismo, neuropatia periférica e lesão das vias eferentes do detrussor.
Obstrução da saída ocorre:
Ø Homens: aumento
da próstata ou estenose uretral.
Ø Mulheres: lesões
uretrais cicatriciais e prolápso vesical ou uterino volumosos.
b.4)
Incontinência mista: é a variedade mais frequente na mulher. Refere-se
a coexistência de mais de um tipo de incontinência em um mesmo paciente. O
mecanismo associa a hiperatividade do detrussor com a redução da função
esfincteriana.
c) incontinência funcional: não envolve
mecanismos controladores da micção. Deve-se à incapacidade dos pacientes em
alcançar o toalete, a tempo de evitar perda de urina, seja por limitações
físicas, transtornos psíquicos, déficit cognitivo, hostilidade ou limitações
ambientais.
Diagnóstico
Deve
reunir história, exame físico e exames complementares facultativos.
História
|
Inicio curso e características da
incontinência
|
Fatores precipitantes
|
Função intestinal
|
Doenças neurológicas
|
Doenças que provocam expansão do
volume intravascular (ex: insuficiência cardíaca)
|
Quantidade de líquido ingerida
|
Cirurgias prévias do aparelho
geniturinário
|
Lista de medicamentos
|
.
Exame físico
|
Analisar
membros inferiores: edema e mobilidade
|
ACV
|
Abdome:
massa, dolorimento, distensão vesical
|
Exame
retal
|
Exame
neurológico detalhado
|
Avaliação
cognitiva e funcional
|
Avaliação
para depressão
|
Exames complementares
a)
Laboratoriais:
urinálise
e urinocultura devem ser realizados em todos os pacientes portadores de
incontinência.
b)
Testes
clínicos:
Ø Teste do estresse: indicado para mulheres que apresentem sintomas
de incontinência de esforço ou mista. Pede-se que a mulher relaxe e em seguida
tussa vigorosamente uma única vez, observando se ocorre perda instantânea ou
retardada de urina.
o
Perda
instantânea: sugere incontinência de esforço
o
Perda
retardada: sugere hiperatividade do detrussor induzida pela tosse.
Ø Medida do volume residual pós-miccional
(ultrassom): é indicado para homens com urgência urinária
antes de se iniciar medicação anticolinérgica, para mulheres submetidas a
cirurgia anti-incontinência que apresentam recorrência de incontinência, para
pacientes que não respondem a anticolinérgicos, para pacientes com infecções
urinárias recidivantes, para portadores de hipoatividade do detrussor ou de
obstrução do fluxo urinário, para pacientes com episódio recorrente de retenção
urinária e para portadores de neuropatia periférica.
Ø Teste urodinâmico: não
deve ser feito de rotina, sendo recomendado apenas sob preceito de terapêutica
invasiva planejada.
Tratamento
1)
Incontinência
transitória: visam reconhecer e tratar as causas
reversíveis, reduzir as doses e/ou suspender medicamentos envolvidos, recuperar
a mobilidade e providenciar modificações ambientais que facilitem o acesso do
indivíduo ao toalete.
2)
Incontinência
estabelecida: inclui medidas não farmacológicas,
farmacológicas e cirúrgicas.
a) Medidas não farmacológicas
MEV
|
Redução
do peso, ajuste da quantidade de líquidos ingeridos, supressão de álcool, de
bebidas cafeinadas e de cigarros.
|
|
Terapia de comportamento
|
Treinamento
vesical
|
|
Exercícios para o
assoalho pélvico
|
Kegel
|
Consiste
no fortalecimento dos mecanismos de pressão uretral pela realização de
contrações musculares isométricas.
|
Cones
vaginais
|
Consiste
na introdução de cones de pesos variados no canal vaginal com a paciente em
ortostatismo.
|
|
Biofeedback
|
Monitoramento,
por aparelhos, de eventos fisiológicos que a paciente é incapaz de
distinguir.
|
|
Eletroestimulação
|
Objetiva
provocar contrações da musculatura pélvica e/ou modular contrações do m detrussor
|
*Treinamento
vesical objetiva aumentar o intervalo entre as micções e, com isso, aumentar a
capacidade vesical. Baseia-se no esquema de micção programada evitando
urgências. Neste estabelece-se pequenos intervalos entre as micções (ex: 2 em
2h) e aumenta tais intervalos progressivamente. Após 2 dias sem incontinência,
o tempo entre as micções deve ser acrescido progressivamente de 30 a 60minutos,
até que se alcance um intervalo de 3 a 4h sem perda urinária.
b) Medidas farmacológicas
·
Anticolinérgicos:
bloqueiam
os receptores muscarinicos no músculo detrussor, consequentemente, diminuem a
contratilidade vesical, aumentam sua capacidade e amenizam a sensação de
urgência.
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