sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

FARMACOLOGIA E TERAPÊUTICA NO IDOSO


Autor: João Maximiano

FARMACOLOGIA E TERAPÊUTICA NO IDOSO


Farmacocinética
1)    Absorção: depende de fatores extrínsecos modificáveis e de fatores intrínsecos relacionados à anatomia e fisiologia do sítio de absorção relacionados à  dinâmica do envelhecimento. As alterações da absorção no envelhecimento são específicas para cada idoso não devendo ser generalizadas como um fato imprescindível.
·         Mucosa oral: apresenta vantagens como a entrada direta na circulação sistêmica sem transposição do TGI e da primeira passagem hepática. Essa via é muito mais confortável e conveniente do que outras formas de administração, notadamente em medicamentos cardiovasculares, analgésicos e psicofármacos.  Problemas da terceira idade como disgeusia (distorções ou diminuição do paladar), xerostomia (déficit de saliva) e atrofia da mucosa oral podem levar a alterações na absorção de  medicamentos de uso bucal ou sublingual.
·         Gastrointestinal: o idoso tem um aumento do pH  gástrico , provocado pela diminuição da  produção de HCl. Isso interfere na ionização e solubilidade de certos medicamentos como: cetoconazol,  amplicina e ferro. A idade diminui a motilidade gastrointestinal, podendo, dessa forma,prolongar o tempo de absorção e/ou aumentar a degradação de medicamentos  pelo HCl. Ocorre ainda redução a redução na superfície da mucosa gastrointestinal e de seu fluxo sanguíneo e da circulação esplâncnica, retardando assim a absorção de vários fármacos. Não ocorre alteração significativa na absorção de medicamentos na  via intestinal, porém vitamina B12, glicose e cálcio tem sua absorção comprometida.
Ocorre diminuição do efeito da primeira passagem hepática interferindo e aumentando biodisponibilidade do fármaco.
·         Via intramuscular: idosos com limitações físicas importantes, sequelas, atrofias musculares ou com síndrome do imobilismo apresentam normalmente menor massa e vascularização muscular.
·         Via conjuntiva: pode estar comprometida pela baixa perfusão ocular.
2)    Distribuição: com relação às proteínas plasmáticas: a distribuição de grande parte dos fármacos se dá por ligação à duas proteínas plasmáticas – a albumina e a α1 glicoproteína ácida. O envelhecimento quando associado à quadros de fragilidade e desnutrição, pode levar à queda da albumina sérica em até 25% resultando no aumento da fração livre de fármacos. Já a α1 glicoproteína ácida, marcador de doença inflamatória crônica, mostra elevação com o avançar da idade e pode indicar redução na fração livre em até 40%.
Com relação à composição corporal: A massa de gordura sofre um aumento de 20 a 40%, ao passo que a massa hídrica é reduzida em até 15%. Dessa forma, fármacos hidrofílicos, podem apresentar volume de distribuição reduzidos e concentração plasmática aumentada, ao passo que o volume de distribuição de fármacos lipofílicos mostra-se elevado.
3)    Metabolismo: o envelhecimento leva à redução da massa total hepática em 20 a 30% e do fluxo sanguíneo hepático em 20 a 50%, com consequente aumento da concentração sérica de fármacos fluxo dependentes.
Com o passar da idade ocorre comprometimento da fase 1 da biotransformação (ver quadro abaixo sobre fases da biotransformação) levando ao aumento da concentração sérica dos fármacos. Tal comprometimento ocorre devido à deficiência na atividade do CyP450. Quadros de fragilidade, desnutrição, multimorbidades e tabagismo também podem influir no metabolismo hepático.





4)    Excreção: nos rins perdem até 30% de seu peso entre os 30 e 90 anos, o que reflete a perda de 60% dos glomérulos, além de atrofia tubular renal, fibrose intersticial a arteriosclerose. Desse modo, a TFG e o fluxo renal estão diminuídos. Devido a estas alterações um indivíduo pode apresentar até 40 a 50% da função renal, levando à um efeito prolongado dos fármacos de excreção renal, cuja eliminação mostra-se reduzida.  Portanto, é necessário ajustar a dose dos medicamentos de eliminação renal através da fórmula para o cleareance de creatinina de Cockroft e Gault, 1976.
Farmacodinâmica
1)    Alterações em mecanismos homeostáticos: alterações orgânicas como:
·         Redução do fluxo sanguíneo renal pela aterosclerose pode modificar a sensibilidade a fármacos de ação central, como antidepressivos e benzodiazepínicos.
·         Redução do reflexo barorreceptor pode desencadear hipotensão postural induzida por anti-hipertensivos.
·         Alterações da termorregulação próprias da idade avançada podem estar relacionada à hipotermia induzida por medicamentos.
·         Menor sensibilidade do sistema nervoso autônomo que possibilita o desenvolvimento frequente de distúrbios de controle pressórico, vesical e intestinal.
·         Distúrbio cognitivos relacionados a quadros demenciais e depressivos podem progredir a delirium mediante administração medicamentosa.
·         A imunossenescência interfere na imunidade celular.
·         Alterações metabólicas aumentam a intolerância à glicose.  
2)    Mudanças em receptores e sítios de ação: alterações em receptores GABA, alfa e beta adrenérgicos, muscarínicos e renais do paratormônio. Essa diminuição desses receptores estaria associada às diferentes respostas apresentadas pelos idosos a medicamentos como vitamina D, benzodiazepínicos e anticolinérgicos em geral.
Iatrogenia medicamentosa e racionalização da prescrição
Para minimizar a possibilidade de iatrogenia é essencial conhecer os principais obstáculos à racionalização da prescrição: polifármacia, prescrição inapropriada e a subtilização de medicamentos.
a)    Polifarmácia: corresponde ao uso contínuo de 5 ou mais medicamentos.
Há indicação para o medicamento?
O medicamento é efetivo para a doença?
A dose está correta?
A orientação ao paciente está correta?
A orientação ao paciente é pratica?
Há interações com outros medicamentos?
Há interações com outras doenças?
Há duplicidade terapêutica?
A duração proposta da terapia é adequada?
Há alguma opção terapêutica de menor custo?
Fatores associados à utilização de vários medicamentos

Múltiplos prescritores

Surgimentos de novas opções farmacológicas para doenças crônicas

Estabelecimento de conceitos de novas doenças

Registro inadequado ou incompleto dos medicamentos em uso

Restrição de tempo para adequação do esquema terapêutico

Intensas estratégias de marketing da industria terapêutica

Produção de conhecimento cientifico exagerado e desproporcional em relação aos benefícios em detrimento dos riscos

Estabelecimento de diretrizes com o uso de múltiplos medicamentos


b)   Prescrição inapropriada: é definida como aquela em que o risco de complicações supera os eventuais benefícios. Pode-se caracterizar pelo uso de medicamentos considerados inapropriados, principalmente os que apresentam meia-vida longa e faixa terapêutica estreita, ou seja, as concentrações séricas tóxicas e terapêuticas são muito próximas, pelo emprego de doses e interações inapropriadas.
Efeitos anticolinérgicos sobre diversos sistemas
Local
Efeito
Consequência
Secreções
Inibe secreções lacrimais, salivares, brônquicas e sudoríparas.
Boca seca, aumento da temperatura corporal.
Cardiovascular
Bloqueio dos receptores musculares cardíacos
Taquicardia
Efeito central
Bradicardia paradoxal
Oculares
Midriase, paralisia da acomodação do olho (cicloplegia) e aumento da pressão intraocular.
Glaucoma.
TGI
Reduz a motilidade e a secreção de HCl
Constipação
Musculatura lisa
Relaxamento brônquico, bexiga e biliar.
Retenção urinária
SNC
Diminuição da dose
Inquietação
Aumento da dose
Agitação/desorientação

c)    Subutilização de medicamentos: situações clássicas em que há maior risco de subutilização de medicamentos são:
·         Diabetes melito associado à proteinúria e insuficiência cardíaca: considerar uso de inibidores da enzima conversora.
·         Fibrilação atrial: indicação para anticoagulação, exceto em situações especiais.
·         Diabetes melito e doença arterial coronária: indicação para emprego de antiagregantes plaquetários.
·         Insuficiência cardíaca: indicação de betabloqueadores conforme o grau funcional.
·         HAS, osteoporose depressão e dislipidemia: tratamentos em que nem sempre o tratamento é instituído corretamente.
·         Profilaxia da ulcera de estresse: considerar sua indicação para pacientes hospitalizados e prescrevê-la sempre que necessário.
Monitoramento de medicamentos
O monitoramento adequado de medicamentos é essencial para a otimização da prescrição. As situações mais frequentes em que o monitoramento é necessário estão listadas no quadro abaixo.
Dosagem de potássio e creatinina em até 1 mês após inicio de diuréticos e inibidores da enzima conversora.
Dosagem periódica de INR em pacientes em uso de varfarina
Ajuste de dose ou troca de medicamento se em até 8 semanas não houver resposta à terapia antidepressiva
Monitoramento do nível sérico de medicamentos quando indicado.









Quadro resumindo alterações na farmacocinética e farmacodinâmica no idoso
Farmacocinética
Processo farmacológico
Alterações observadas
Consequências
Absorção
Aumento do pH gástrico
Interfere na ionização e solubilidade de certos medicamentos
Diminui a motilidade TGI, fluxo sanguíneo e circulação esplâncnica.
Não altera a absorção da maioria dos medicamentos.
Diminui o fenômeno da primeira passagem hepática.


Fármacos: aumentar a biodisponibilidade
Pró-farmacos: diminuir a biodisponibilidade
Numero de células absortivas diminui
Não interfere de forma significativa.
Sarcopenia
Altera a absorção IM
Distribuição
Proteínas plasmáticas
Albumina (reduz em idosos frágeis)
Aumenta a fração livre de fármacos ligados à albumina que tem caráter ácido.
α1glicoproteina ácida (aumenta)
Diminui a fração livre de medicamentos de caráter básico.
Composição corporal
Massa hídrica (reduz)
Diminui o volume de distribuição de fármacos hidrossolúveis ex: digoxina
Massa lipídica (aumenta)
Aumenta a meia-vida de fármacos lipossolúveis ex: benzodiazepínicos.
Metabolismo
Diminui a massa e fluxo hepático
Diminuição no metabolismo de fármacos fluxo-dependentes
Diminui o fenômeno da primeira passagem por deficiência da CyP450.
Aumenta a biodisponibilidade de fármacos
Excreção
Diminuição da massa renal, do fluxo plasmático renal e da TFG.
Diminuição do clearance dos fármacos de eliminação renal
Farmacodinâmica
Homeostase
Diminuição do fluxo sanguíneo pela aterosclerose
Altera a sensibilidade a fármacos de ação central
Redução do reflexo barorreceptor
Hipotensão postural ocasionada por anti-hipertensivos
Alterações na termorregulação
Hipotermia induzida por medicamentos
Menor sensibilidade do SNA
Distúrbios no controle pressórico, vesical e intestinal.
Distúrbios demenciais e depressivos
Podem evoluir para delirium na presença de medicamentos
Imunossenescência
Interfere na imunidade celular
Alterações metabólicas
Diminuem a tolerância à glicose
Receptores
Diminuição de receptores GABA, alfa e beta adrenérgicos, muscarínicos e renais do paratormônio
Sensibilidade alterada (ex: fármacos de ação no SNC)

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