FEBRE EM PEDIATRIA
João Lage
Definição de febre: febre
é um estado em que o organismo aumenta a temperatura corporal acima de 37,8°C e
estabiliza neste novo valor. Isso é comandado pelo centro termorregulador
localizado no hipotálamo.
A
febre é diferente da hipertermia. Neste ultimo caso a temperatura elevada é
decorrente de um desequilíbrio entre o calor recebido e as forças dissipadoras.
A
hipertermia pode ocorrer em situações como: desidratação, hipernatremia,
insolação, calor excessivo, hipertireoidismo.
A
diferenciação dos conceitos de febre e hipertermia são importantes, pois a
terapêutica é diferente nos dois casos.
Temperatura corporal normal: o
homem mantém sua temperatura interna quase constante, variando de 0,5°C a 1°C
durante suas atividades diárias. A temperatura corporal sofre a influência de
inúmeros fatores entre eles temos:
·
Idade
·
Sexo
·
Hidratação
·
Nutrição
·
Hora do dia
·
Temperatura ambiental
·
Emoção
·
Vestuário
Para
medir a temperatura é necessário que o termômetro seja mantido no local 3
minutos para a temperatura axilar e 1 minuto para a temperatura oral e retal. A
tabela abaixo mostra os limites para cada região:
Axilar
|
37,3°C
|
Oral
|
37,6°C
|
Retal
|
37,8°C
|
Vários
agentes infecciosos, imunológicos ou tóxicos – pirógenos exógenos – induzem a
produção de pirógenos endógenos pelas células inflamatórias do hospedeiro,
principalmente macrófagos e monócitos. Esses pirógenos endógenos são citocinas
(IL-1 e IL-6), Fatores de necrose tumoral e o interferon-a que estimulam o
hipotálamo a produzir PGE2 e outros metabólitos do ácido araquidônico, elevando
o ponto estabilizador da temperatura do centro regulador.
Classificação da febre: classicamente
são conhecidos vários tipos de febre, que, só ocasionalmente, podem ajudar na
formulação do diagnóstico:
Tipo
|
Padrão
|
Significado
|
Contínuo
|
Quando as oscilações diárias entre Max e
min não excedem 1°C
|
Ex: febre tifoide
|
Remitente
|
Quando as oscilações são superiores a 1°C
porem a mínima não atinge valores normais.
|
Padrão mais comum de febre ocorrendo nas
infecções viróticas e bacterianas.
|
Intermitente
|
Quando se alternam períodos piréticos com
apiréticos.
|
Ex: tuberculose
|
Recorrente
ou recidivante
|
Quando há alternância de alguns dias de
febre, geralmente contínua com alguns dias de apirexia
|
Ex: malaria terçã ou quartã.
|
Quadro clínico: febre
é apenas um sinal que, isoladamente, não permite diferenciar uma doença benigna
de outra potencialmente grave. As crianças febris podem ser dividas em três
grupos: 1) febre com sinais de localização, 2) febre recente, sem sinais de
localização e 3) febre de origem indeterminada.
a)
Febre
com sinais de localização: na maioria das vezes, a história e o
exame físico são suficientes para se estabelecer o diagnóstico e o tratamento
específico, com predomínio absoluto dos processos de etiologia viral –
principalmente, de vias aéreas superiores – de curta duração e autolimitados.
b)
Febre
recente sem sinais de localização: febre como sinal isolado
pode ser comum caso a moléstia tenha se iniciado até 24 antes da consulta. Nesse
caso geralmente temos uma infecção viral autolimitada. Porem em 3 a 5% dos
casos pode-se ter uma bacteremia oculta que pode evoluir com pneumonia, pielonefrite
entre outras. Por outro lado deve-se
evitar o uso desnecessário de antibióticos. Portanto, é necessário investigar
fatores de risco e solicitar exames complementares bem selecionados. Abaixo
estão os fatores de risco:
·
Crianças menores de 60 dias
·
Temperatura superior a 39,4°C
·
Hemograma: contagem leucocitária total
inferior a 5000 ou superior a 15000/mm3. Plaquetas.
·
Urina rotina, urinocultura.
·
Velocidade de hemossedimentação (VHM) >
30mm/h
·
Proteína C reativa quantitativa > 40mg/L
·
Presença de petéquias
·
Paciente imuncomprometido
c)
Febre
de origem indeterminada: em pediatria a definição está como febre elevada > 37,3°C com mais de 2
semanas com intervenção e exames de triagem inconclusivos. As principais causas
em crianças são em ordem decrescente: 1) doenças infecciosas, 2) doenças
auto-imunes, 3) neoplasias ou 4) sem diagnóstico definido.
Tratamento
A
decisão de se tratar ou não a febre em si (tentar normalizar a temperatura)
depende dos fatos já apresentados, existem evidências de que a febre estimula
as defesas do organismo, mas provavelmente essa vantagem é apenas marginal; não
existe risco pela febre alta em si, a não ser em crianças muito debilitadas,
cardiopatas ou com insuficiência respiratória. Por outro lado, lesões do sistema
nervoso central poderiam ocorrer em níveis próximos de 42,5 ºC; a febre se
associa com desconforto, o qual pode ser aliviado por meios que normalizam a
temperatura2 ; a febre pode desencadear convulsão em crianças suscetíveis.
.
Com
base nessas premissas, o tratamento deve ser individualizado. Cabe ao pediatra
combater (e nunca contribuir) para a febrefobia, mas não lhe é permitido, seja
por questões de princípio ou com base em conhecimentos científicos incompletos,
negar alívio ao paciente. Não só ao paciente, pois o cortejo sintomático que
acompanha a febre provoca uma mudança temporária no comportamento da criança cujos
pais deixam de reconhecer nela seu filho, o que aumenta a ansiedade e o
mal-estar.
Em
conclusão deve-se tratar a febre nas seguintes situações:
·
Temperatura axilar superior a 38°C nas
crianças em tratamento ambulatorial, ou de 38,5°C naquelas em tratamento
hospitalar. Podem ser medicadas em temperaturas inferiores quando o desconforto
for grande. Deve-se evitar a prescrição de antitérmicos em horários fixos,
recomendando-se sua utilização apenas quando necessário.
·
Crianças com antecedentes pessoais ou
familiares de convulsões ou portadoras de doenças neurológicas.
·
Criança em alto risco: cardiopatias,
pneumopata crônicos, anêmicos, nefropatias ou portadores de doenças
metabólicas, pelo risco de descompensação.
a)
Medidas
gerais: retirar roupas quentes, ambiente arejado, oferta de
líquidos e alimentos mais leves e redução do esforço físico.
b)
Medidas
físicas: compressas mornas, banhos de imersão em água morna (15 a
30 minutos), fricção de esponja morna.
c)
Medidas
farmacológicas
·
Aspirina
(AAS): é indicada na dose de 10 a 15mg/Kg/dose, por via oral, a
cada quatro a seis horas. Ter cuidado em suspeita de doenças hemofílicas.
·
Paracetamol:
é
recomendada a dose de 10 a 15mg/Kg/dose, não devendo ultrapassar 750mg dose ou
4g dia.
·
Dipirona:
é
indicado a dose de 10-25mg/Kg/dose não devendo passar 100mg/Kg/dia em quatro a
seis tomadas.
Orientação prática aos pais
1. Se
for o caso, esclarecer que se trata de doença presumivelmente viral, geralmente
benigna e cuja febre é autolimitada a três dias completos. Explicar que a
criança (especialmente o pré-escolar) tem infecções virais (evitaro termo
“virose”) freqüentes, e que isso é benéfico a longo prazo, pois estimula seu
mecanismo imunológico (defesa). Pode também ser o caso de uma infecção bacteriana
não grave (rinossinusite, amigdalite), com antibiótico adequado já iniciado,
que necessita de 48 horas para que a febre cesse.
2.
Utilizar roupas leves, manter o ambiente ventilado; nas horas mais agradáveis
do dia, a criança pode ficar ao ar livre, sem exposição direta ao sol.
3. Oferecer
líquidos com frequência e de acordo com a preferência (água, chás, sucos, água
de coco, refrigerante).
4.
Advertir que a redução do apetite é inevitável, e que a criança deve ser
alimentada com aquilo que ela aceita e tolera melhor e reforçado de acordo com
as possibilidades.
5.
Explicar que uma febre moderada estimula os mecanismos de defesa contra a
infecção, e assim não há necessidade nem vantagem de normalizar inteiramente a temperatura.
6.
Explicar que, por isso, o objetivo do antitérmico é apenas aliviar o desconforto
causado pela febre, e deve ser usado apenas nos momentos em que ela está
ocasionando indisposição acentuada, sem horário prefixado, mas respeitando o
intervalo mínimo de cada medicamento.
7.
Liberar os pais de tomadas freqüentes da temperatura, reservando-a para
momentos de grande abatimento, tremores de frio ou se a criança parecer excessivamente
“quentinha”. Nesses casos, manter o termômetro firmemente colocado sob a axila,
por 4 minutos.
8.
Prescrever o antitérmico mais facilmente disponível e individualizar segundo a
preferência, disponibilidade, aceitação, tolerância e eficácia habitual dos
antitérmicos usuais (acetominofeno, dipirona ou antiinflamatório não hormonal -
AINH). Advertir para não “misturar” AINH e outros antitérmicos (perigo de
hipotermia). Orientar quanto à dose correta e intervalo mínimo. Esclarecer que
a diminuição da febre e do mal-estar só ocorre enquanto o antitérmico está
fazendo efeito (4-6 horas, 8-12 horas para AINH), e que o retorno da febre após
esse período é esperado, e não significa fracasso terapêutico.
9.
Conversar sobre o benefício limitado do banho de imersão e das compressas
mornas, que podem ser utilizados após o antitérmico, quando seu efeito não foi totalmente
satisfatório; advertir contra o uso de água fria e contra a adição de álcool.
Banho e compressas são aceitáveis, quando isso for do agrado da criança e não trouxer
transtornos para a família.
10.
Ensinar (falar e escrever) os sinais de alerta: febre acima de 39,4 ºC com tremores
de frio, abatimento acentuado ou forte indisposição (sonolência e
irritabilidade, choro inconsolável ou choramingas, gemência) que não melhoram
após o efeito da dose de antitérmico; aparecimento de sintomas diferentes;
febre que ultrapassa três dias completos. A disponibilidade (telefone, retorno)
é medida insubstituível.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
comenta ai vai!!