INFECÇÕES RESPIRATÓRIAS AGUDAS COM ÊNFASE EM IVAS
João lage
Considerações gerais: as
infecções respiratórias agudas (IRA) correspondem à principal demanda nos
serviços de saúde sendo responsável por 12 a 35% das internações pediátricas
hospitalares.
De
acordo com a OMS as IRA´s são divididas em infecções das vias aéreas inferiores,
caudal a laringe, e infecção das vias aéreas superiores (IVAS), cefálico à
laringe incluindo a mesma. Frequentemente ocorre afecção de varias regiões
devendo a denominação diagnóstica referir-se à áreas ou regiões anatômicas mais
acometidas.
Sabe-se
que 90% das infecções respiratórias agudas são não-bacterianas, já tendo sido
identificados mais de 200 sorotipos diferentes de agentes virais. Entre as
bactérias destacam-se Streptococcus
pneumoniae, Hemophilus influenzae, os Streptococcus b-hemolíticos dos
grupos A e C e os estafilococos.
Questões
a serem levantadas em caso de criança com suspeita de IRA:
·
É
localizada ou envolve mais de uma região?
·
Acompanha-se
de manifestações sistêmicas?
·
A
etiologia provável é não infecciosa, viral ou bacteriana?
·
Se
bacteriana qual o agente mais provável?
·
Há
evidencias de alergia respiratória?
·
Exames
complementares são necessários?
·
Há
risco de vida para criança?
·
Existe
indicação de tratamento hospitalar?
Pontos
importantes da anamnese:
·
Caracterizar
o início dos sintomas (súbito ou insidioso),
·
O
padrão de febres,
·
Se o
acometimento do estado geral ocorre apenas nos surtos febris ou é contínuo.
·
Evolução
das manifestações respiratórias
·
Interrogar
sobre o estado de saúde das pessoas que convivem com a criança
·
Interrogar
sobre condições ambientais (características da moradia, quantas pessoas vivem
nela, exposição excessiva a pós domiciliar, exposição ao mofo ou outros
alérgenos, familiares tabagistas, regularidade de exposição ao sol)
·
Regularidade
vacinal da criança
·
Possível
hospitalização recente
Pontos
importantes do exame físico
·
AR:
narinas, mucosa nasal, cornetos nasais, mucosa oral, gengivas, palato,
amígdalas, faringe, ouvidos. Realizar percussão, palpação e ausculta pulmonar.,
1)
Rinofaringite
aguda (resfriado comum): dados epidemiológicos mostraram que
podem ocorrer até 8 resfriados/ano durante o primeiro e o segundo ano de vida
frequência que diminuí progressivamente até a adolescência. O principal agente
etiológico é o rinovirus.
·
Sintomatologia
comum: paciente mostra-se afebril, sem acometimento do estado
geral e com rinorréia serosa e obstrução
nasal.
·
Sintomatologia
mais acentuada: febre alta, cefaleia, mialgia (dor
muscular), mal estar e inapetência (perda do apetite). Quadro mais comum em
crianças menores.
Obs. O aspecto da
secreção serosa pode se modificar até se tornar purulento não indicando
necessariamente infecção bacteriana secundária. Porém, a persistência da
rinorréia mucopurulenta por mais de 10 a 14 dias sugere infecção bacteriana
secundária, rinite (inflamação da mucosa nasal) bacteriana ou sinusite, e nesse
caso, a antibioticoterapia está indicada.
·
Ao
exame físico: a faringe apresenta-se difusamente
hiperemiada e os tímpanos podem estar congestos, nos primeiros dois a três
dias, o que também não deve ser interpretado como infecção bacteriana.
·
Duração: a
febre, o mal-estar e a mialgia podem prolongar-se por até 8 dias. A tosse pode
durar até 2 semanas.
Abaixo
segue um quadro caracterizando os tipos de rinorréia o que pode ser útil na
busca da etiologia:
Rinorréia
|
Aspecto
|
Significado
|
Serosa
|
Clara (líquida)
|
Alergia/fase inicial das viroses/rinites
bacterianas primárias ou secundárias e efeito medicamentoso (iodismo)
|
Seromucosa ou mucosa
|
Liquida + muco claro
|
Fase intermediária e final das rinites virais e
resposta alérgica; presença desta secreção+ferimentos superficiais na pele em
torno das narina = impetigo* nasal estreptocócico.
|
Mucopurulenta ou purulenta
|
Contem pus
|
Fase final das renites virais/rinites bacterianas
primárias e secundárias/sinusites
|
Serossanguinolenta
|
Contem sangue
|
Traumatismo da mucosa/corpo estranho/sífilis
congênita precoce/difteria nasal/rinite bacteriana/às vezes sarampo.
|
*impetigo:
infecção cutânea superficial.
·
Achado
histológico: rinossinusite aguda não supurativa.
·
Conduta: as
IVAS virais não são influenciadas na sua evolução por medicamentos disponíveis.
Assim, o tratamento sintomático visa por objetivo tornar a doença mais
confortável.
a)
Apoio
nutricional: considerar e respeitar inapetência. Oferecer
aquilo que a criança aceita melhor fracionando em volumes menores e intervalos
mais curtos. Aumentar a densidade calórica, aumentando farinhas, cereais e
gordura (óleo).
Oferecer líquidos com
frequência, especialmente sucos adoçados.
Aproveitar o aumento do
apetite na convalescença para ministrar 1 refeição a mais por dia do que o
habitual e alimentar com densidade energética aumentada.
b)
Medicamentos
Ø Evitar
antigripais industrializados, inúteis.
Ø Preferir
medicação caseira tradicional (recomendada pela OMS): a base de louro, guaco,
poejo ou agrião, alho (expectorante), açúcar ou mel (emoliente – ação
refrescante na mucosa), caldo de frango (substâncias aromáticas – ação
descongestionante).
Ø Para
a congestão nasal: instilar soro fisiológico morno nas narinas. Pode ser
preparado com 1 copo de água filtrada e fervida + 1 colher de café de sal.
Produto farmacêutico: Rinosoro.
Ø Para
a obstrução nasal: gotas vasoconstritoras locais: preferência pela
oximetazolina (Afrin pediátrico, Aturgyl pediátrico), 2 ou 3 gotas em cada
narina, 2 ou 3 vezes ao dia, não devendo ultrapassar 5 dias. Em lactentes
diluir o medicamento com soro fisiológico (meio a meio). Caso o ministrador tem
dificuldade em pingar o medicamento pode-se usar um cotonete embebido do
medicamento.
Ø Secreção
mucopurulenta muito espessa: considerar uso de acetilcisteína (Fluimucil, 3
gotas, 3 vezes ao dia, por no máximo 5 dias). Se não houver melhora em 2 dias,
considerar antibiótico.
Ø Usar
analgésicos e antitérmicos para alívio do mal estar.
c)
Medidas
gerais: ensinar a criança a assoar o nariz. Em lactentes usar uma
pera de borracha após instilação do soro fisiológico.
·
Complicações:
as
complicações habituais do resfriado comum são otite média aguda, sinusite e pneumonia.
A infecção viral abre caminho para a superinfecção bacteriana. Neste caso as
seguintes manifestações costumam estar presentes: 1) agravamento do quadro
clinico e febre > 39°C durante a evolução (numa fase em que já deveria ter
melhorado), 2) secreção serosa ou seromucosa fica purulenta persistindo por
mais de 7 dias e há aparecimento deste tipo de secreção nos olhos na forma de
remelas., 3)dor de ouvido com choro persistente e irritabilidade, 4) tosse
persistente diurna e noturna por mais de 10 dias sem tendência à melhora. Neste
caso é necessário iniciar a antibioticoterapia:
v Amoxicilina: 45mg/Kg/dia,
fracionado de 12/12h
v Se suspeita de pneumococos moderadamente
resistentes: 90mg/Kg/dia em 2 tomadas 12/12h.
v Se houver possibilidade de hemófilo resistente
(amoxilina ministrada recentemente: amoxilina-clavulanato BD;
alternativa: cefuroxima (Zinnat).
Duração: 7 dias.
Reavaliar conforme evolução e em casos muito prolongados ou de repetição a
curto prazo ampliar para 10 a 14 dias.
2) Otite média aguda (OMA): frequentemente,
instala-se após um quadro de resfriado comum , quando a ventilação normal pela
tuba faringotimpânica se acha prejudicada.
Fatores associados à OMA
são: baixa idade, técnicas inadequadas de amamentação, e malformações
congênitas.
Os principais agentes da OMA
são bacterianos, embora se saiba que os vírus que estejam acometendo outras
regiões do trato respiratório também podem localizar no ouvido médio. O
principal causador é o Streptococcus
pneumoniae seguido pelo Hemophilus
influenzae.
·
Sintomatologia
típica: febre, otalgia, irritabilidade exagerada e vômitos.
·
Sintomatologia
associada: cefaleia, diarreia, hipoacusia e vertigem.
·
Ao
exame físico: congestão
da membrana timpânica, hiperemia, perda da transparência e abaulamento da
membrana timpânica. Se ela romper fluirá secreção purulenta, fétida, pelo canal
auditivo.
·
Conduta:
o
tratamento sintomático é feito com analgésicos e antitérmicos e calor local.
Uma vez feito o diagnóstico de OMA, indica-se antibioticoterapia, mesmo sabendo
que cura espontânea pode ocorrer na maioria dos casos. Os antibióticos visam a
aliviar mais rapidamente os sintomas, a prevenir a evolução para doença crônica
e a evitar complicações graves – como meningite e mastoidite, por exemplo.
É importante diferenciar OMA
de otite media de efusão (OME) evitando desta forma uma antibioticoterapia
desnecessária. A OME é definida como a presença de secreção estéril no ouvido
médio sem manifestações clínicas de infecção; as alterações da membrana
timpânica são semelhantes às que ocorrem na OMA porem a secreção neste ultimo
caso caracteriza-se por estar infectada. O OME acompanha IVAS ou segue uma OMA
bacteriana. Inicialmente a OME não requer tratamento apenas se persistir por
mais de 3 meses.
Os antibióticos devem ser
usados sempre que sinais sistêmicos ou locais de doença aguda (otalgia,
abaulamento da membrana timpânica, otorréia, febre e vômitos).
Droga
de primeira escolha: amoxilina 45mg/Kg/dia (12/12h) por 5-7 dias.
Como alternativa pode-se
usar sulfametoxazol-trimetoprim (Bactrim) ou se há alergia à penicilina pode-se
usar macrolíticos como eritromicina (eritram) e azitromicina.
A duração do tratamento é de
5 a 7 dias para crianças maiores de 2 anos e de 10 dias para lactentes, aqueles
com perfuração da MT ou que passam o dia em creches.
Caso haja falha terapêutica
(persistência da otalgia, febre, abaulamento da MT ou da otorréia após 3 dias
de antibioticoterapia) é indicada a mudança no esquema terapêutico, com as
seguintes opções: amoxilina 90mg/Kg/dia ou amoxilina-clavulanato BD. Ainda pode-se
utilizar cefuroxime 30mg/Kg/dose. Caso estes pacientes apresentem intolerância
às drogas por via oral usar ceftriaxona na dose única de 50mg/Kg/dia durante
três dias consecutivos. Estas opções terapêuticas também são recomendadas para
pacientes que fizeram uso de amoxicilina nos últimos 30 dias.
3)
Sinusite
aguda: estima-se que 0,5% a 5% dos casos de rinofaringite aguda
se compliquem como sinusite aguda. Essa importância amplia-se em indivíduos
alérgicos, em que tem sido descritas até 50% de alterações dos seios da face ao
estudo radiológico.
Os seios etmoidais e
maxilares já estão formados ao nascimento porem os frontais e esfenoidais só se
pneumatizam-se mais tardiamente aos 6 a 8 anos de idade.
A sinusite é desencadeada
por obstrução dos óstios de drenagem dos seios da face, que favorece a retenção
de secreção e infecção bacteriana secundária.
·
Sintomatologia
mais frequente: persistência de sintomas de um resfriado
comum como rinorréia, fluida ou espessa, mucosa ou mucopurulenta; tosse noturna
e obstrução nasal sem evidências de remissão decorridos 10 dias de sua
instalação. Cefaleia, dor facial, odor fétido durante a respiração e febre são
referidas por crianças maiores. Levando-se em conta a duração dos sintomas, a
sinusite é classificada de acordo com a tabela abaixo:
Duração
|
Classificação
|
Até
30 dias
|
Aguda
|
30
dias a 3 meses
|
Subaguda
|
>
3 meses
|
Crônica
|
·
Diagnóstico:
na
maioria das vezes, o exame físico ajuda pouco no diagnóstico de sinusite,
podendo revelar mucosa nasal eritematosa e secreção purulenta no cavum. A presença de secreção purulenta
no meato médio após aplicação de vasoconstritor tópico á altamente sugestiva de
sinusite.
As duas modalidades de exame
de imagem utilizadas no diagnóstico são:
Ø Radiografia: frontonaso
(estudo dos seios maxilares), mentonaso (seio frontal e etmoidal) e lateral
(verificar seios esfenoidais).
Ø Tomografia computadorizada: indicada
nos casos recorrentes para avaliação do óstio-meatal, quando existe suspeita de
complicações (envolvimento intracraniano ou orbital)ou no caso de anormalidades
persistentes na radiografia convencional.
·
Tratamento:
tem
como objetivo promover a drenagem dos seios, eliminar a infecção, reduzir edema
de mucosa, proporcionar alivio dos sintomas e prevenir recorrências.
Inicialmente, baseia-se no uso de antibióticos adequados – como amoxilina ou
amoxilina-clavulanato em doses usuaus, ou ainda, bactrim. O período mínimo de
tratamento deve ser de 10 a 14 dias ou até uma semana após resolução dos
sintomas. Doses altas de amoxilina isoladamente ou associadas ao clavulanato,
azitromicina, claritromicina ou cloranfenicol, são recomendadas nos casos
recidivantes ou que não respondem ao tratamento usual. O tratamento coadjuvante
pode incluir uso de descongestionantes tópicos ou sistêmicos.
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