quinta-feira, 14 de março de 2013

IVAS


INFECÇÕES RESPIRATÓRIAS AGUDAS COM ÊNFASE EM IVAS

João lage


Considerações gerais: as infecções respiratórias agudas (IRA) correspondem à principal demanda nos serviços de saúde sendo responsável por 12 a 35% das internações pediátricas hospitalares.
De acordo com a OMS as IRA´s são divididas em infecções das vias aéreas inferiores, caudal a laringe, e infecção das vias aéreas superiores (IVAS), cefálico à laringe incluindo a mesma. Frequentemente ocorre afecção de varias regiões devendo a denominação diagnóstica referir-se à áreas ou regiões anatômicas mais acometidas.  
Sabe-se que 90% das infecções respiratórias agudas são não-bacterianas, já tendo sido identificados mais de 200 sorotipos diferentes de agentes virais. Entre as bactérias destacam-se Streptococcus pneumoniae, Hemophilus influenzae, os Streptococcus b-hemolíticos dos grupos A e C e os estafilococos.
Questões a serem levantadas em caso de criança com suspeita de IRA:
·         É localizada ou envolve mais de uma região?
·         Acompanha-se de manifestações sistêmicas?
·         A etiologia provável é não infecciosa, viral ou bacteriana?
·         Se bacteriana qual o agente mais provável?
·         Há evidencias de alergia respiratória?
·         Exames complementares são necessários?
·         Há risco de vida para criança?
·         Existe indicação de tratamento hospitalar?
Pontos importantes da anamnese:
·         Caracterizar o início dos sintomas (súbito ou insidioso),
·         O padrão de febres,
·         Se o acometimento do estado geral ocorre apenas nos surtos febris ou é contínuo.
·         Evolução das manifestações respiratórias
·         Interrogar sobre o estado de saúde das pessoas que convivem com a criança
·         Interrogar sobre condições ambientais (características da moradia, quantas pessoas vivem nela, exposição excessiva a pós domiciliar, exposição ao mofo ou outros alérgenos, familiares tabagistas, regularidade de exposição ao sol)
·         Regularidade vacinal da criança
·         Possível hospitalização recente
Pontos importantes do exame físico
·         AR: narinas, mucosa nasal, cornetos nasais, mucosa oral, gengivas, palato, amígdalas, faringe, ouvidos. Realizar percussão, palpação e ausculta pulmonar.,

1)    Rinofaringite aguda (resfriado comum): dados epidemiológicos mostraram que podem ocorrer até 8 resfriados/ano durante o primeiro e o segundo ano de vida frequência que diminuí progressivamente até a adolescência. O principal agente etiológico é o rinovirus.
·         Sintomatologia comum: paciente mostra-se afebril, sem acometimento do estado geral e com rinorréia serosa e obstrução nasal.
·         Sintomatologia mais acentuada: febre alta, cefaleia, mialgia (dor muscular), mal estar e inapetência (perda do apetite). Quadro mais comum em crianças menores.
Obs. O aspecto da secreção serosa pode se modificar até se tornar purulento não indicando necessariamente infecção bacteriana secundária. Porém, a persistência da rinorréia mucopurulenta por mais de 10 a 14 dias sugere infecção bacteriana secundária, rinite (inflamação da mucosa nasal) bacteriana ou sinusite, e nesse caso, a antibioticoterapia está indicada.
·         Ao exame físico: a faringe apresenta-se difusamente hiperemiada e os tímpanos podem estar congestos, nos primeiros dois a três dias, o que também não deve ser interpretado como infecção bacteriana.
·         Duração: a febre, o mal-estar e a mialgia podem prolongar-se por até 8 dias. A tosse pode durar até 2 semanas.
Abaixo segue um quadro caracterizando os tipos de rinorréia o que pode ser útil na busca da etiologia:
Rinorréia
Aspecto
Significado
Serosa
Clara (líquida)
Alergia/fase inicial das viroses/rinites bacterianas primárias ou secundárias e efeito medicamentoso (iodismo)
Seromucosa ou mucosa
Liquida + muco claro
Fase intermediária e final das rinites virais e resposta alérgica; presença desta secreção+ferimentos superficiais na pele em torno das narina = impetigo* nasal estreptocócico.
Mucopurulenta ou purulenta
Contem pus
Fase final das renites virais/rinites bacterianas primárias e secundárias/sinusites
Serossanguinolenta
Contem sangue
Traumatismo da mucosa/corpo estranho/sífilis congênita precoce/difteria nasal/rinite bacteriana/às vezes sarampo.

*impetigo: infecção cutânea superficial.
·         Achado histológico: rinossinusite aguda não supurativa.
·         Conduta: as IVAS virais não são influenciadas na sua evolução por medicamentos disponíveis. Assim, o tratamento sintomático visa por objetivo tornar a doença mais confortável.
a)    Apoio nutricional: considerar e respeitar inapetência. Oferecer aquilo que a criança aceita melhor fracionando em volumes menores e intervalos mais curtos. Aumentar a densidade calórica, aumentando farinhas, cereais e gordura (óleo).
Oferecer líquidos com frequência, especialmente sucos adoçados.
Aproveitar o aumento do apetite na convalescença para ministrar 1 refeição a mais por dia do que o habitual e alimentar com densidade energética aumentada.
b)   Medicamentos
Ø  Evitar antigripais industrializados, inúteis.
Ø  Preferir medicação caseira tradicional (recomendada pela OMS): a base de louro, guaco, poejo ou agrião, alho (expectorante), açúcar ou mel (emoliente – ação refrescante na mucosa), caldo de frango (substâncias aromáticas – ação descongestionante).
Ø  Para a congestão nasal: instilar soro fisiológico morno nas narinas. Pode ser preparado com 1 copo de água filtrada e fervida + 1 colher de café de sal. Produto farmacêutico: Rinosoro.
Ø  Para a obstrução nasal: gotas vasoconstritoras locais: preferência pela oximetazolina (Afrin pediátrico, Aturgyl pediátrico), 2 ou 3 gotas em cada narina, 2 ou 3 vezes ao dia, não devendo ultrapassar 5 dias. Em lactentes diluir o medicamento com soro fisiológico (meio a meio). Caso o ministrador tem dificuldade em pingar o medicamento pode-se usar um cotonete embebido do medicamento.
Ø  Secreção mucopurulenta muito espessa: considerar uso de acetilcisteína (Fluimucil, 3 gotas, 3 vezes ao dia, por no máximo 5 dias). Se não houver melhora em 2 dias, considerar antibiótico.
Ø  Usar analgésicos e antitérmicos para alívio do mal estar.
c)    Medidas gerais: ensinar a criança a assoar o nariz. Em lactentes usar uma pera de borracha após instilação do soro fisiológico.
·         Complicações: as complicações habituais do resfriado comum são otite média aguda, sinusite e pneumonia. A infecção viral abre caminho para a superinfecção bacteriana. Neste caso as seguintes manifestações costumam estar presentes: 1) agravamento do quadro clinico e febre > 39°C durante a evolução (numa fase em que já deveria ter melhorado), 2) secreção serosa ou seromucosa fica purulenta persistindo por mais de 7 dias e há aparecimento deste tipo de secreção nos olhos na forma de remelas., 3)dor de ouvido com choro persistente e irritabilidade, 4) tosse persistente diurna e noturna por mais de 10 dias sem tendência à melhora. Neste caso é necessário iniciar a antibioticoterapia:
v  Amoxicilina: 45mg/Kg/dia, fracionado de 12/12h
v  Se suspeita de pneumococos moderadamente resistentes: 90mg/Kg/dia em 2 tomadas 12/12h.
v  Se houver possibilidade de hemófilo resistente (amoxilina ministrada recentemente: amoxilina-clavulanato BD; alternativa: cefuroxima (Zinnat).
Duração: 7 dias. Reavaliar conforme evolução e em casos muito prolongados ou de repetição a curto prazo ampliar para 10 a 14 dias.
2)    Otite média aguda (OMA): frequentemente, instala-se após um quadro de resfriado comum , quando a ventilação normal pela tuba faringotimpânica se acha prejudicada.
Fatores associados à OMA são: baixa idade, técnicas inadequadas de amamentação, e malformações congênitas.
Os principais agentes da OMA são bacterianos, embora se saiba que os vírus que estejam acometendo outras regiões do trato respiratório também podem localizar no ouvido médio. O principal causador é o Streptococcus pneumoniae seguido pelo Hemophilus influenzae.
·         Sintomatologia típica: febre, otalgia, irritabilidade exagerada e vômitos.
·         Sintomatologia associada: cefaleia, diarreia, hipoacusia e vertigem.
·         Ao exame físico: congestão da membrana timpânica, hiperemia, perda da transparência e abaulamento da membrana timpânica. Se ela romper fluirá secreção purulenta, fétida, pelo canal auditivo.
·         Conduta: o tratamento sintomático é feito com analgésicos e antitérmicos e calor local. Uma vez feito o diagnóstico de OMA, indica-se antibioticoterapia, mesmo sabendo que cura espontânea pode ocorrer na maioria dos casos. Os antibióticos visam a aliviar mais rapidamente os sintomas, a prevenir a evolução para doença crônica e a evitar complicações graves – como meningite e mastoidite, por exemplo.
É importante diferenciar OMA de otite media de efusão (OME) evitando desta forma uma antibioticoterapia desnecessária. A OME é definida como a presença de secreção estéril no ouvido médio sem manifestações clínicas de infecção; as alterações da membrana timpânica são semelhantes às que ocorrem na OMA porem a secreção neste ultimo caso caracteriza-se por estar infectada. O OME acompanha IVAS ou segue uma OMA bacteriana. Inicialmente a OME não requer tratamento apenas se persistir por mais de 3 meses.
Os antibióticos devem ser usados sempre que sinais sistêmicos ou locais de doença aguda (otalgia, abaulamento da membrana timpânica, otorréia, febre e vômitos).
Droga de primeira escolha: amoxilina 45mg/Kg/dia (12/12h) por 5-7 dias.
Como alternativa pode-se usar sulfametoxazol-trimetoprim (Bactrim) ou se há alergia à penicilina pode-se usar macrolíticos como eritromicina (eritram) e azitromicina.
A duração do tratamento é de 5 a 7 dias para crianças maiores de 2 anos e de 10 dias para lactentes, aqueles com perfuração da MT ou que passam o dia em creches.
Caso haja falha terapêutica (persistência da otalgia, febre, abaulamento da MT ou da otorréia após 3 dias de antibioticoterapia) é indicada a mudança no esquema terapêutico, com as seguintes opções: amoxilina 90mg/Kg/dia ou amoxilina-clavulanato BD. Ainda pode-se utilizar cefuroxime 30mg/Kg/dose. Caso estes pacientes apresentem intolerância às drogas por via oral usar ceftriaxona na dose única de 50mg/Kg/dia durante três dias consecutivos. Estas opções terapêuticas também são recomendadas para pacientes que fizeram uso de amoxicilina nos últimos 30 dias.
3)    Sinusite aguda: estima-se que 0,5% a 5% dos casos de rinofaringite aguda se compliquem como sinusite aguda. Essa importância amplia-se em indivíduos alérgicos, em que tem sido descritas até 50% de alterações dos seios da face ao estudo radiológico.
Os seios etmoidais e maxilares já estão formados ao nascimento porem os frontais e esfenoidais só se pneumatizam-se mais tardiamente aos 6 a 8 anos de idade.
A sinusite é desencadeada por obstrução dos óstios de drenagem dos seios da face, que favorece a retenção de secreção e infecção bacteriana secundária.
·         Sintomatologia mais frequente: persistência de sintomas de um resfriado comum como rinorréia, fluida ou espessa, mucosa ou mucopurulenta; tosse noturna e obstrução nasal sem evidências de remissão decorridos 10 dias de sua instalação. Cefaleia, dor facial, odor fétido durante a respiração e febre são referidas por crianças maiores. Levando-se em conta a duração dos sintomas, a sinusite é classificada de acordo com a tabela abaixo:

Duração
Classificação
Até 30 dias
Aguda
30 dias a 3 meses
Subaguda
> 3 meses
Crônica

·         Diagnóstico: na maioria das vezes, o exame físico ajuda pouco no diagnóstico de sinusite, podendo revelar mucosa nasal eritematosa e secreção purulenta no cavum. A presença de secreção purulenta no meato médio após aplicação de vasoconstritor tópico á altamente sugestiva de sinusite.
As duas modalidades de exame de imagem utilizadas no diagnóstico são:
Ø  Radiografia: frontonaso (estudo dos seios maxilares), mentonaso (seio frontal e etmoidal) e lateral (verificar seios esfenoidais).
Ø  Tomografia computadorizada: indicada nos casos recorrentes para avaliação do óstio-meatal, quando existe suspeita de complicações (envolvimento intracraniano ou orbital)ou no caso de anormalidades persistentes na radiografia convencional.
·         Tratamento: tem como objetivo promover a drenagem dos seios, eliminar a infecção, reduzir edema de mucosa, proporcionar alivio dos sintomas e prevenir recorrências. Inicialmente, baseia-se no uso de antibióticos adequados – como amoxilina ou amoxilina-clavulanato em doses usuaus, ou ainda, bactrim. O período mínimo de tratamento deve ser de 10 a 14 dias ou até uma semana após resolução dos sintomas. Doses altas de amoxilina isoladamente ou associadas ao clavulanato, azitromicina, claritromicina ou cloranfenicol, são recomendadas nos casos recidivantes ou que não respondem ao tratamento usual. O tratamento coadjuvante pode incluir uso de descongestionantes tópicos ou sistêmicos.



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