DPOC
João Lage
Definição:
a doença pulmonar
obstrutiva crônica (DPOC) é uma enfermidade respiratória prevenível e tratável,
que se caracteriza pela presença de obstrução crônica do fluxo aéreo, que não é
totalmente reversível. A obstrução do fluxo aéreo é geralmente progressiva e está
associada a uma resposta inflamatória anormal dos pulmões à inalação de
partículas ou gases tóxicos, causada primariamente pelo tabagismo. Embora a
DPOC comprometa os pulmões, ela também produz consequências sistêmicas
significativas.
A inflamação dos pulmões pode produzir
alterações no:
·
Brônquios:
bronquite crônica;
·
Bronquíolos:
bronquiolite obstrutiva
·
Parênquima
pulmonar: enfisema pulmonar
Epidemiologia:
segundo estudos a
DPOC é mais frequente em homens, aumenta com a idade e diminui com o aumento da
escolaridade. Em 2001 a DPOC
configurou-se como a sexta causa de morte no Brasil. A doença apresenta
correlação ocupacional principalmente no que diz respeito à exposição às
indústrias de borracha, plásticos, couro, têxtil, moagem de grãos, produtos
alimentícios, entre outros segmentos de produção. O percentual de DPOC
atribuído ao trabalho foi estimado em 19,2% no geral e em 31,1% entre os
não-fumantes.
Fisiopatogênese
a)
Bronquite
crônica
·
Linfócitos:
na DPOC LT CD8+ infiltram-se em grandes e
pequenas vias respiratórias e no parênquima pulmonar. Há ainda aumento do
número de células que expressam o receptor de IL-2 (marcador de ativação
celular recente) e de células que expressam o antígeno de ativação tardia
(AAT-1) (marcador de ativação celular crônica). Acredita-se que os LT CD8+
estejam implicados na lesão do parênquima pulmonar e no recrutamento de
neutrófilos.
·
Macrófagos:
os macrófagos apresentam-se aumentados nas vias
respiratórias bem como no parênquima. Em especial encontra-se aumentados nas
regiões onde há destruição da parede alveolar. Participam do processo
inflamatório por meio da liberação de mediadores como TNF-a, IL-8 e LTB4, que
promovem quimiotaxia de neutrófilos.
·
Neutrófilos:
na DPOC existe ambiente de citocinas propício o acumulo
de NE como IL-8, TNF-a e decréscimo de IL-10 (citocina anti-inflamatória). Tem
também aumento da expressão de E-selectina e ICAM-1 (moléculas de adesão) nos
vasos submucosos e no epitélio brônquico, as quais favorecem o acúmulo de NE na
luz das vias respiratórias. Os NE produzem elastase que funciona como um
secretagogo aumentando a secreção brônquica.
·
Células
epiteliais: produzem mediadores inflamatórios
como eicosanoides, citocinas e moléculas de adesão entre elas E-selectina o que
favorece o recrutamento de NE.
b)
Enfisema
pulmonar: é definido como aumento anormal e
permanente do tamanho dos acínos pulmonares associado a destruição dos septos
alveolares, sem fibrose evidente. A teoria mais aceita para a patogênese do
enfisema é o mecanismo protease-antiprotease
segundo a qual o enfisema resulta de desequilíbrio entre proteases e
antiproteases, com predomínio da ação das proteases e consequente destruição
dos septos alveolares.
Os
principais produtores de enzimas proteolíticas (proteases) no trato
respiratório são neutrófilos e macrófagos. Ambos presentes em maior numero no
pulmão de fumantes por motivos explicitados mais a frente. Os neutrófilos
produzem serinoelastase e os macrófagos metaloelastases.
Existem
varias antiproteases no fluido que reveste o epitélio respiratório. A mais
abundante é a α1-antitripsina (α1-AT) que possui a maior
antielastase no parênquima pulmonar. Tal antiprotease é diminuída em: 1)
exposição a partículas irritantes e 2) em indivíduos com predisposição
genética.
Neutrófilos
e macrófagos estão presentes em maior numero no pulmão de fumantes e isso, é
explicado em parte pelos motivos listados no quadro abaixo.
Teorias
para o acumulo de NE e macrófagos no pulmão de fumantes
|
O fumo faz com que macrófagos
liberem fatores quimiotáticos para NE
|
A nicotina age como fator
quimiotático para NE
|
Agentes tóxicos do cigarro se aderem
a parede das vias respiratórias induzindo inflamação e promovendo a aderência
NE.
|
Outras ações do fumo: 1)
estimula a produção de elastase pelos NE e aumenta sua capacidade proteolítica,
2)Radicais de oxigênio derivados do fumo agridem diretamente os componentes da
matriz extracelular e reduzem a ação da α1-AT.
Fatores de risco
Diagnóstico
É
realizado através de uma avaliação clínica, espirométrica, através da
radiologia, oximetria e gasometria sendo as duas primeiras o padrão ouro.
Avaliação clínica:
·
A
tosse é o sintoma mais frequente na DPOC sendo que 50% dos pacientes apresenta
tosse produtiva.
·
A
dispneia é o principal sintoma associado à incapacidade funcional do paciente.
Na maioria das vezes, é percebida apenas nos estágios mais avançados da doença,
uma vez que, o paciente a correlaciona ao envelhecimento. O índice de dispnéia
do MRC (Medical Research Council) apresenta boa correlação com o prognóstico da
DPOC (Quadro 1).
·
É
importante também, durante a anamnese, conhecer a exposição ao tabaco e a
outros gases irritantes. Exposição à fumaça do fogão a lenha deve ser
investigada. A história ocupacional deve ser aprofundada.
Avaliação
espirométrica: A
espirometria com obtenção da curva expiratória volume-tempo é obrigatória na
suspeita clínica de DPOC, devendo ser realizada antes e após administração de
broncodilatador, de preferência em fase estável da doença. A espirometria
permite a avaliação de uma multiplicidade de parâmetros, porém os mais
importantes do ponto de vista de aplicação clínica são a CVF (capacidade vital
forçada), o VEF1 (volume expiratório forçado no primeiro segundo), e a relação
VEF1/CVF, pois mostram menor variabilidade inter e intra-individual. A
existência de limitação do fluxo aéreo é definida pela presença da relação VEF1/CVF abaixo de 0,70 pós-broncodilatador.
Avaliação
radiológica: Na DPOC
deve-se solicitar, rotineiramente, uma radiografia simples de tórax nas
posições póstero-anterior e perfil, não para definição da doença, mas para
afastar outras doenças pulmonares, principalmente a neoplasia pulmonar. A
radiografia de tórax pode ainda identificar bolhas, com possível indicação
cirúrgica. A tomografia computadorizada de tórax está indicada na DPOC somente
em casos especiais, como suspeita da presença de bronquiectasias ou bolhas,
indicação de correção cirúrgica destas ou programação de cirurgia redutora de
volume.
Avaliação
gasométrica e do pH: A
avaliação da oxigenação pode ser feita, inicialmente, de maneira não invasiva
pela oximetria de pulso. Se for identificada uma saturação periférica de
oxigênio (SpO2) igual ou inferior a 90%, está indicada a realização de
gasometria arterial para avaliação da PaO2 e da PaCO2. A oximetria deve ser
repetida periodicamente e sempre que houver exacerbação.
Diagnóstico
diferencial
·
Asma: é a doença que causa maior confusão
diagnóstica. Difere da DPOC em aspectos que vão desde a epidemiologia até a
inflamação em si. A grande diferença está na resposta a corticoide inalatório,
em que, a resposta é muito mais expressiva no paciente asmático.
·
Bronquiolites: Pontos importantes para o diagnóstico:
não-tabagista, dispnéia de progressão mais acelerada do que na DPOC, encontro
de padrão de mosaico na tomografia de tórax de alta resolução, baixa
prevalência.
·
Bronquiectasias
·
Tuberculose: pode ser diferenciada pela radiografia
do tórax e pela pesquisa de BAAR no escarro.
·
ICC: aumento da área cardíaca à radiografia de tórax, exames complementares
cardiológicos podem auxiliar na diferenciação do diagnóstico.
Estadiamento
*o
VEF1 neste caso também é pós-BD
·
A
presença de hipoxemia sem hipercapnia é equivalente a MRC 2 ou 3.
·
MRC
grau 4 é equivalente a sinais de ICC (cor pulmonale) e equivalente a
Hipercapnia
Tratamento
da DPOC estável
a) Broncodilatadores:
configuram a base do
tratamento da sintomatologia das doenças obstrutivas. Deve-se sempre, exceto em
casos de exarcebação, optar pela via inalatória, uma vez que, a via oral
apresenta efeitos colaterais mais acentuados.
São broncodilatadores potentes e seguros que atuam abrindo os canais de
potássio e aumentando o AMP cíclico.
β2-agonistas: Os β2-agonistas de longa duração,
formoterol e salmeterol, quando comparados aos β2-agonistas de curta ação,
fenoterol, salbutamol e terbutalino e ao anticolinérgico brometo de ipratrópio,
são mais eficazes, resultando em redução da dispnéia e melhora funcional mais
acentuada e mais duradoura.
Anticolinérgicos:
o brometo de ipratrópio
é um antagonista inespecífico dos receptores muscarínicos O pico de ação varia
entre 30 a 90 minutos e a duração de 4 a 6h. O brometo de tiotrópio é um
anticolinérgico de longa duração, mais eficaz que o ipratrópio, com
seletividade farmacocinética para os receptores muscarínicos M1 e M3,
permitindo a sua utilização em dose única diária.
Xantinas:
as xantinas tem
efeito broncodilatador inferior ao dos outros broncodilatadores listados acima
e devem ser utilizadas como ultima opção terapêutica broncodilatadora.
b) Corticoides
inalatórios: indicados
quando VEF1 < 50% e que necessitou do uso de antibiótico e
corticoide oral por conta de uma exarcebação no ano anterior ou paciente que
teve 2 ou mais exarcebações no ano anterior.
c) Corticóide
sistêmico: o
corticóide sistêmico está indicado nas exacerbações infecciosas e não
infecciosas, pois já foi demonstrado que o seu uso por 14 dias reduz os
sintomas e melhora o VEF1 e a PaO2 em menor tempo.
d) Oxigenoterapia:
visa manter a
saturação de O2 > 90% comprovada na gasometria arterial. São
indicações para oxigenoterapia:
Ø PaO2 ≤55 mmHg ou saturação ≤88% em
repouso;
Ø PaO2 entre 56 e 59 mmHg com evidências
de cor pulmonale ou policitemia.
e) Vacinação: é indicada a anti-influenza anual e a antipneumocócica (não deve ser repetida antes de 5 anos).
e) Vacinação: é indicada a anti-influenza anual e a antipneumocócica (não deve ser repetida antes de 5 anos).
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