Tuberculose
João Lage
Epidemiologia:
apesar de o Brasil
ser um dos 22 países que contribui para 90% dos casos de tuberculose (TB) no
mundo, até o ano de 2007, observou-se uma queda de 27% no número de casos no
país.
Na região sul e centro-oeste o numero
de casos ficou em 30/100000 habitantes e na região sudeste, norte e nordeste em
50/100000 habitantes.
De acordo com o Ministério da Saúde o
gênero masculino e a faixa etária entre 44-59 anos apresentam a maior
incidência da doença.
A comorbidade TB/HIV ocorreu em 6,2%
dos casos, apesar de apenas metade dos casos terem o exame anti-HIV solicitado.
O percentual de cura e abandono no ano
de 2006 foram respectivamente 73 % e 9%. Adicionalmente ocorreu uma queda de
31% na mortalidade entre 1990 e 2006.
Frequência da doença: no Brasil é monitorada pelo Sistema
Nacional de Agravo de Notificações (SINAN) para as doenças infectocontagiosas.
Etiologia:
o principal
responsável pela tuberculose é o Mycobacterium
tuberculosis ou Bacilo de Koch. Apresenta-se ao microscópio, após
coloração, isolado ou aos pares, como bastonetes delgados, retos ou
ligeiramente encurvados. É estritamente aeróbio.
Modo de transmissão: a fonte de infecção habitual é a
pessoa infectada com tuberculose pulmonar que libera o bacilo para o meio
exterior. A capacidade do bacilo de ser transmitido de um doente para outro
depende do estado bacteriológico deste doente como pode ser elucidado em
seguir:
·
Doentes
bacilíferos (B+) - a
baciloscopia do escarro é positiva e o doente elimina uma quantidade de bacilos
superior a 5.000 por ml de escarro;
·
Doentes
não-bacilíferos - a
baciloscopia do escarro é negativa e a cultura pode ser positiva (C+) ou
negativa (C-).
Outro fator importante que interfere na capacidade
de contágio é a intensidade do contato com o doente. Neste caso, conseguimos
explicar em parte a razão pela qual a doença acomete principalmente pessoas de
baixa renda, uma vez que essa população é constituída por famílias numerosas
que vivem em casas pequenas, mal-ventiladas e úmidas.
A fala, o espirro e, principalmente a tosse de um
paciente com tuberculose lança no ar partículas as quais aquelas com até 5µ e
com 1 a 2 bacilos atingem os alvéolos e causam a doença. As gotículas maiores
são removidas pelo sistema mucociliar de defesa, são deglutidos, inativados
pelo suco gástrico do estômago e eliminados nas fezes.
Os bacilos que se depositam em roupas, copos,
utensílios dificilmente chegaram ao pulmão, portanto não devem ser considerados
como fonte de transmissão.
Fisiopatologia:
o Mycobacterium tuberculosis apresenta em
sua parede três componentes básicos, cada qual com determinada função na reação
inflamatória: 1) lipídeos que são responsáveis pela ativação de monócitos e
macrófagos e posteriormente transformação em células epitelíoides e células
gigantes multinucleadas, 2) proteína (tuberculoproteína), que confere
sensibilização ao bacilo e contribui para a formação de células epitelíóides e
células gigantes e 3) carboidratos, responsáveis pela reação neutrofílica.
a) Tuberculose
primária: é aquela
que ocorre em indivíduos que não tiveram contato prévio com o Mycobacterium tuberculoses. Como tal é
mais comum em crianças porem também pode ocorrer em adultos ou idosos que se
mudam de um ambiente pouco contaminado para um centro urbano muito contaminado.
O primeiro contato do bacilo com o ser humano determina varias reações:
1)exsudativa (nódulo exsudativo), 2)produtiva (granuloma duro), 3) produtivo
caseosa (granuloma com necrose caseosa) ou de cicatrização (nódulo
calcificado).
·
Reação
exsudativa: durante a primeira semana após a
chegada do bacilo nos alvéolos ocorrerá uma resposta de natureza inata
comandada por macrófagos residentes e NE atraídos para o local. Os macrófagos
fagocitam os bacilos porém não consegue eliminá-los, uma vez que, tais bacilos
produzem inibidores que impedem a fusão fagossomo-lisossomo. Dessa maneira
estes bacilos conseguem uma boa proliferação e dão origem a uma inflamação
inespecífica. Em alguns indivíduos os NE liberam substâncias oxidativas e
elastases que originam um foco de alveolite aguda exsudativa caracterizada por
necrose dos alvéolos, exsudação de fibrina, NE degenerados e grande número de bacilos
viáveis. Essa evolução com pior prognóstico é comum em imunodeprimidos.
·
Reação
produtiva: como a resposta puramente exsudativa não é
eficaz para conter o avanço do bacilo, é acionada uma nova linha de defesa. Macrófagos infectados liberam IL-12 que
induzirá a produção de IFN-γ pelos LTH1. Tal interferon ativará os macrófagos
que poderão então eliminar os bacilos. Tal ativação também induz a liberação de
TNF-α pelos macrófagos que induziram a reação de hipersensibilidade formando os
granulomas. Os macrófagos também por ação do interferon transformam-se em
células epitelióides e estas tendem a se aglomerar formando células gigantes e
ocupando o centro do granuloma. Ao redor das células gigantes teremos células
epitelióides e na periferia temos linfócitos, macrófagos e poucos plasmócitos.
·
Reação
produtivo-caseosa: macrófagos, células epitelióides e LT
causam a morte de bacilos existentes no granuloma. Dependendo do número de
bacilos presentes e do grau de hipersensibilidade ocorrerá necrose caseosa no centro
do granuloma.
·
Reação
de cicatrização: com a morte dos bacilos e o controle da
multiplicação bacteriana, o granuloma segue o curso natural de reparação de
toda reação inflamatória, que é sua colagenização induzida pelo fator de
crescimento de fibroblastos secretado pelos macrófagos. Com isso a lesão entra
em processo de cicatrização, hialinização e calcificação.
A reação inflamatória
inicial e os granulomas, com ou sem necrose central, formam-se
preferencialmente na região inferior do lobo superior ou na superior do lobo
inferior. O conjunto desses granulomas recebe o nome de nódulo de Ghon. A
partir deste, os bacilos alcançam o sistema linfático e os linfonodos hílares
onde determinam a mesma reação inflamatória gerando linfadenite granulomatosa.
Ao conjunto da linfadenite e o nódulo de Ghon dá-se o nome de complexo primário
ou de Ghon.
O complexo primário pode
ter dois destinos: 1)cura, que se dá pela destruição dos microorganismos e pela
reparação de cicatrização e calcificação das lesões tanto do parênquima quanto
dos linfonodos. Neste caso o que resta é uma pequena cicatriz mostrando que o
indivíduo entrou em contato com o microorganismo porem não desenvolveu a
doença. 2) Evolução para TB.
Neste segundo desfecho o
bacilo poderá se disseminar para outras partes dos pulmões ou, através da
corrente sanguínea, alcançar outros órgãos.
b) Tuberculose
secundária: mais
comum em adultos, é aquela que ocorre no indivíduo que teve anteriormente a
priminfecção. Os bacilos após a priminfcção podem ficar em estado latente nos
locais mais aerados do pulmão principalmente os ápices. Na vida, adulta
qualquer condição que ocasione queda da imunidade pode fazer com que os bacilos
dormente voltem a se multiplicar e deem origem a novos granulomas e a novas
lesões (tuberculose por reativação – endógena). Outras vezes o indivíduo curado
anteriormente é novamente infectando pelo bacilo neste caso constituindo
reativação exógena. As lesões da TB secundária apresentam-se em quatro formas
microscópicas: apical, cavernosa, ácino-nodosa e miliar.
·
Tuberculose apical: a reativação dos bacilos dá origem a
granulomas produtivo-caseosos e nódulos fibrocalcificados. É comum encontrar
nestes casos extensas lesões fibrocaseosas nos ápices pulmonares.
·
Tuberculose cavernosa (forma
necrosante): quando
de forma extensa necrose nos locais atingidos, o material necrótico se liquefaz
e é drenado por um brônquio, dando origem a grandes cavitações macroscópicas
conhecidas como cavernas tuberculosas.
Quando há também destruição de vasos sanguíneos ocorre hemoptise. Com a fibrose
que se forma na parede das cavernas e no parênquima adjacente às vezes podem
surgir outras lesões pulmonares (obstrução brônquica, bronquiectasia, enfisema
cicatricial).
·
Tuberculose ácino-nodosa (padrão broncopneumonico):
a partir da lesão
apical ou de reativação de lesão primária, pode haver proliferação dos bacilos
e sua disseminação pelas vias respiratórias. O transporte dos bacilos através
dos brônquios por ação dos movimentos respiratórios leva ao aparecimento de
lesões axiais peribrônquicas que acompanham a histoarquitetura pulmonar. Neste
caso ocorre condensação parenquimatosa com a forma acinar. Quando ácinos
adjacentes são acometidos formam-se lesões em trevo. Se atingem a pleura,
forma-se pleurite tuberculosa, com derrame pleural.
·
Tuberculose miliar: pode atingir outros órgãos.
Diagnóstico
a) Sinais e
sintomas: o principal sintoma da tuberculose é uma tosse
persistente por três ou mais semanas. Abaixo segue um quadro com importantes considerações
a serem feitas na pesquisa de TB:
b) Probabilidade
social: pessoas com baixa renda vivendo em áreas
urbanas densas, com precárias condições de habitação e famílias numerosas, tem
maior probabilidade de se infectar, adoecer e morrer pela TB. Igualmente com
alta probabilidade são as
instituições fechadas como presídios, casas de correção de menores, abrigos de
idosos, abrigos sociais, creches
e escolas, entre outras.
É dever do profissional de saúde realizar uma busca
ativa por pacientes com TB e isso pode ser feito em três esferas:
·
Busca na comunidade:
deve-se buscar TB em todos indivíduos que apresentarem tosse e escarro porá
mais de 3 semanas. A pesquisa de ser feita por exame bacteriológico (BAAR e se
necessário Cultura) e caso de negativo para os dois deve-se pedir Radiografia
de tórax. Populações de risco já citadas devem ter atenção redobrada principalmente
aqueles portadores do vírus do HIV os quais qualquer sintoma respiratório deve
ser encarado como TB.
·
Busca na demanda
·
Busca entre contatos
c) Exames
complementares
Os
exames utilizados na investigação diagnóstica de tuberculose são:
bacteriológicos, bioquímicos, citológicos, radiológicos, histopatológicos e
imunológicos. Outros métodos de diagnóstico, como aqueles que utilizam técnicas
de biologia molecular, vêm sendo avaliados e, no momento, sua utilização é
restrita a instituições de pesquisa.
Bacteriológico
Na
prática de rotina o exame utilizado para diagnóstico é o bacteriológico, uma
vez que, é de fácil realização e de baixo custo. Entre os exames
bacteriológicos temos a pesquisa de bacilos no escarro (BAAR) e a cultura. O
primeiro é mais rápido, porem para ser positivo é necessário mais de 5000
bacilos o que o torna um exame falso negativo para TB brandas a moderadas. Para
tanto, usa-se a cultura que pode descobrir TB mesmo diante de poucos bacilos no
escarro, no entanto a cultura pode demorar de 2 a 4 semanas para divulgar
resultados.
Colheita do escarro:
A boa colheita do
escarro é proveniente da árvore brônquica e não da faringe onde tem-se saliva.
Solicita-se ao paciente duas amostras do escarro, uma obtida na primeira
consulta e a outra no dia seguinte ao despertar-se.
Orientações:
·
Lavar a boca antes de colher o
escarro.
·
Inspirar profundamente, reter por
instantes o ar no pulmão, tossir e alcançar o material no recipiente. Esta
manobra deve ser repetida até obter-se 3 amostras de escarro.
·
Fechar hermeticamente o pote mantendo
a boca pra cima.
·
Lavar as mãos com água e sabão.
·
Caso o escarro seja insuficiente
pode-se induzi-lo com solução salina ou recorrer a outros métodos como colheita
do material por broncoscopia e lavagem gástrica.
A
cultura deve ser realizada caso a sintomatologia permaneça sugestiva e a
baciloscopia tenha dado negativo. Em algumas situações especiais após a
realização da cultura pode-se fazer um teste de sensibilidade a drogas na qual
é possível orientar o tratamento com a droga mais eficaz. As situações em que
este teste que pode demorar de 20 a 28 dias, é feito estão listadas abaixo:
Radiologia
A TB causa alterações
radiológicas na maioria dos casos, servindo, portanto como uma boa ferramenta
na investigação da doença, bem como, no seu acompanhamento.
A imagem radiológica na
TB primária: a principal alteração vista
radiologicamente que sugere TB primária é de caráter bipolar onde em um dos
polos observa-se aumento hilar por hipertrofia dos linfonodos regionais
consequência da disseminação linfática do foco de Ghon e, no outro polo,
observa-se opacificação parenquitomatosa, geralmente ipsilateral ao hilo
aumentado, porém sem predileção por lobos ou segmentos.
A
tuberculose pode desaparecer totalmente ou deixar calcificações denominadas,
nódulos de Ghon em lobos inferiores e focos de Simon em lobos superiores.
O
surgimento de imagens cavitárias indica pior prognóstico. A cavitação implica a
possibilidade de complicações tanto relacionadas com a disseminação canalicular
quanto em razão da erosão de vasos arteriais, originando os pseudo-aneurismas
de Rasmussen responsáveis por hemoptises vultosas, às vezes fulminantes. As
cavidades são surpreendidas no curso da doença em mais da metade dos casos. Têm
paredes espessas, podem ser únicas ou múltiplas, variando entre alguns
milímetros a vários centímetros de diâmetro.
A imagem radiológica na
TB pós-primária (secudária): A tuberculose de reinfecção ou
pós-primária é praticamente exclusiva do adulto. Tem predileção pelos segmentos
dorsais dos lobos superiores e pelos segmentos apicais dos lobos inferiores. Em
razão da predominância das lesões nos lobos superiores, a incidência
ápico-lordótica ou de Fleischner é extremamente útil para demonstrar alterações
mal definidas, escondidas pelas clavículas e arcos costais superiores.
A evolução da
tuberculose do ponto de vista radiológico
Prova
tuberculínica
A prova tuberculínica é um
exame complementar que pode ser utilizado. Se positiva, indica infecção prévia
pelo Mycobacterium. Deve-se lembrar que ela não permite distinguir o
indivíduo infectado do doente. Em regiões onde a vacina BCG é aplicada
rotineiramente pode ocorrer prejuízo na utilização da prova tuberculínica.
Todos os pacientes com HIV
devem ser submetidos a prova tuberculínica. Caso a prova tenha resultado
negativo deverá ser obrigatoriamente repetida.
Tratamento
Os medicamentos principais utilizados
no tratamento são:
R
|
Rifampicina
|
H
|
Etambutol
|
Z
|
Isoniazida
|
E
|
Pirazinamida
|
Esquema básico de tratamento
(2RHZE/4RH)
É
indicado para todos os casos novos de todas as formas de TB pulmonar e
extrapulmonar (exceto meningoencefalite), bem como para todos os casos de recidiva
e retorno após abandono.
É
proposto ainda que os pacientes que apresentarem pesquisa direta de BAAR positiva
no final do segundo mês de tratamento realizem cultura com identificação da
micobactéria e teste de sensibilidade ao final do segundo mês pela
possibilidade de TB resistente.
Vacinação
BCG
A vacina BCG protege contra
manifestações graves da primoinfecção por Mtb, como as disseminações hematogênicas
e a meningoencefalite, mas não evita a infecção pela microbactéria (Mtb).
A vacina BCG é prioritariamente
indicada em crianças de até 4 anos de idade, sendo obrigatória para menores de
1 ano.
É recomendação de vacinação BCG em:
·
RN
com peso > 2kG e sem intercorrências clínicas.
·
RN
filhos de mães com SIDA
·
Crianças
soropositivas para HIV ou filhos de mães com SIDA, desde que tenham teste
tuberculínico não reator e sejam assintomáticos para a crise.
·
Contatos
de doentes com hanseníase.
A revacinação deve ser feita apenas
nos casos em que crianças após 6 meses da primovacinação não apresentarem
cicatriz vacinal sendo prioritária em < 5 anos.
Ao usar os esquemas com logo da UNIFENAS favor citar o nome da Universidade
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