sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

ANEMIA FERROPRIVA NA INFÂNCIA



Anemia Carêncial Ferropriva

João Lage

Definição de Anemia Ferropriva e prevalência: anemia ferropriva é a carência nutricional mais prevalente no mundo acarretando prejuízos a curto e longo prazo no desenvolvimento neuropsicomotor, aprendizagem e resposta imunológica. A anemia acomete aproximadamente 42% das crianças menores de 5 anos em países em desenvolvimento e 17% em países desenvolvidos.
Estágios da deficiência de ferro:
Depleção de reserva
Carência de ferro nos estoques com ferritina menor que o normal. Outros exames normais
Depleção de Fe sem anemia
Série vermelha normal e alteração no metabolismo do Fe: diminuição do Fe sérico,
porcentagem de saturação de siderofilina e ferritina diminuída.
Depleção de Fe com anemia
Anemia hipocrômica e microcítica com Hb < 12mg/dl (mulheres) < 13mg/dl (homens) e
<11mg/dl (crianças e gestantes). Diminuição do Htc, HCM e VCM. Ferro sérico diminuído
Porcentagem de saturação da transferrina < 16%, ferritina < 12ng/ml, aumento da
Protoporfirina livre e da capacidade total de ligação de ferro.


Metabolismo do ferro: o ferro da dieta existe na forma heme (origem animal) e não heme (origem vegetal). A absorção do ferro é influenciada por alguns fatores que são:
·         Dieta (valido para ferro não heme)
·         Hepcidina (inibe a absorção do ferro. Quando a deficiência do nutriente sua concentração diminuí aumentando a absorção do ferro)
·         Saturação de transferrina (se estiver baixa estimula a saída do ferro do enterócito para a corrente sanguínea através da membrana basolateral)
·         Pela presença de fatores dietéticos estimuladores e inibidores de sua absorção.

Substâncias adjuvantes (Válido p/ Fe não heme)
Substâncias inibidoras
Ácido ascórbico
Fosfatos (ovos)
Substâncias redutoras
Fitatos (grãos)
Aminoácidos
Oxalatos
Açucares (lactose e frutose)
Leite e manteiga
·         pH do lúmen gastrintestinal: quanto mais ácido maior a absorção do Fe pois o mesmo passa da forma férrica para ferrosa que é mais fácil de absorver.
·         A bile favorece a absorção de Fe, pois contem ácido ascórbico.
·         Fatores extraluminais
Ø  Depósito de ferro: quando os depósitos estão depletados, favorecem a absorção de Fe.
Ø  Atividade eritropoiética: o aumento desta atividade favorece a absorção de Fe.
Ø  Crescimento:o ganho de peso promove aumento da absorção de Fe.

A absorção do ferro ocorre de maneira distinta para o Fe heme e não heme, porem o aparelho de absorção é semelhante. A absorção acontece nos enterócitos que contem uma borda em escova que fica em contato com o lúmen intestinal e uma borda basolateral em contato com a corrente sanguínea. O Fe necessita atravessar a borda em escova, todo o enterócito e conforme a necessidade do nutriente atravessa a membrana basolateral ficando disponível para os tecidos.

Ferro heme: o ferro heme entra no enterócito por meio de uma vesícula. Após a entrada no citosol, o ferro ferroso (Fe+2), é enzimaticamente removido do complexo ferroporfirina e incorporado a apoferritina para formação da ferritina, podendo permanecer estocado no interior do enterócito (estoque intracelular de ferro) ou ser transportado para a circulação. A ferritina, portanto tem duas funções: 1) estocagem intracelular de Fe e 2) transporte intracelular de Fe. A biodisponibilidade do Fe heme dica entre 15% e 35%.

Ferro não heme: entra no enterócito, na sua forma ferrosa (Fe2+), por difusão facilitada utilizando um transportador de metal bivalente 1 (DMT1). Como dito anteriormente, quanto menor o pH do lúmen maior a apresentação ferrosa do ferro não heme e, portanto maior sua absorção. O Fe2+ se liga então a apoferrritina para formar ferritina. A biodisponibilidade do fe não heme fica entre 2% a 10%.

A passagem para a corrente a sanguínea é comum para ambos as apresentações férricas, uma vez que, agora existe um produto em comum que é a ferritina. Esta então, de acordo com a necessidade do organismo, por transporte ativo e sob ação da ferroportina será desassociada liberando o Fe2+ na circulação, porem o Fe na forma livre é muito reativo e poderia funcionar como radical livre, portanto ele se liga à transferrina que o transporta para os tecidos. Em complemento cabe ressaltar que a Hepcidina anteriormente citada age inibindo a ferroportina o que diminuí a disponibilidade de Fe para os tecidos.

Transporte intercelular: o conceito atual é que o complexo ferro-transferrina seja internalizado na célula por um mecanismo de endocitose, mediada por receptores. Formam-se então vesículas endocíticas donde o pH cai e a oxirredutase reduz o ferro da forma férrica (Fe3+) para ferrosa, facilitando sua remoção da transferrina. A transferrina sem o Fe retorna para a circulação, onde se liga a outro íon ferro e reinicia o ciclo para levar mais ferro para o interior das células.

Diagnóstico clínico: A gravidade e as repercussões da deficiência de ferro dependem da intensidade da deficiência de ferro, da faixa etária e estágio de vida.

Fatores de risco para deficiência de Ferro
Ø  RN prematuros.
Ø  RN com baixo peso ao nascer
Ø  Filhos de mães diabéticas
Ø  Portadores de doenças crônicas
Ø  Baixo nível sócio-econômico
Ø  Ser lactente
Ø  Deficiência de ferro da mãe durante a gestação
Ø  Idade < 2 anos
Ø  Alimentação inadequada
Ø  Interrupção do aleitamento materno exclusivo antes de 6 meses

História clínica
Exame físico
·         Palidez
·         Apatia
·         Adinamia
·         Dispnéia
·         Dificuldade para realizar exercício
·         Dificuldade de termorregulação
·         Fadiga crônica
·         Imunodeficiência
·         Geofagia
·         Inapetência 
·         Leve sopro sistólico no foco mitral
·         Mucosas hipocoradas
·         Atraso no crescimento
·         Esplenomegalia
Diagnóstico laboratorial: inicialmente é necessário esclarecer a diferença entre anemia e deficiência de ferro. No primeiro caso refere-se a diminuição da hemoglobina (Hb) dois DP para a idade em análise. E deficiência de Fe é a quantidade insuficiente do elemento para manter as funções fisiológicas das células.

Hemograma

Hemoglobina: determina se há ou não anemia.

VCM e HCM: a análise do volume corpuscular médio e hemoglobina corpuscular média são indicares úteis. Geralmente a anemia ferropriva clássica manifesta-se por hipocromia (HCM < 23) e microcitose (VCM < 70).

Hematoscopia: pode apresentar acentuada poiquilocitose e hemácias em alvo.

RDW: corresponde a amplitude de variação do tamanho de eritrócitos. Valores superiores a 14% podem indicar deficiência de ferro.

Cinética do Ferro

Ferritina: é um marcador indireto do depósito corporal de Fe e quando em níveis baixos geralmente indica anemia ferropriva ou deficiência de ferro. Valores de referência: 12 a 15mcg/L (no adulto) e 10 – 12mcg/L (na criança). Em infecções, inflamações, doença hepática e malignidade a ferritina poderá estar elevada sendo seu valor de referência para deficiência de Ferro < 30mcg/L. Situações onde pode estar diminuída compreendem o hipotireoidismo e deficiência de ascorbato.

Capacidade total de ligação do ferro (CTLF): aumenta na deficiência de ferro. Seu valor de referência é de 360. Porem, por diminuir na inflamação representa um exame menos sensível que a ferritina, uma vez que na coexistência de inflamação e deficiência de ferro seu valor pode estar normal.

Dosagem de ferro sérico e saturação de transferrina: o ferro sérico apresenta variações amplas ao longo do dia não sendo um parâmetro ideal para elucidar sua deficiência. O limiar inferior é de 15. A saturação de transferrina é um marcador um pouco mais sensível e tem seu limiar inferior igual a 12.

Protoporfirina eritrocitária livre: tende a aumentar na deficiência de ferro. Limiar superior é 50mcg/dl.



Prevenção: é pautada em três pontos principais: 1) educação nutricional, 2) fortificação de alimentos e 3) suplementação medicamentosa.

Educação nutricional: disponibilizar à criança alimentos com alta biodisponibilidade de ferro complementado com alimentos adjuvantes que melhoram a absorção do nutriente (ver tabela anteriormente citada) e evitando os fatores inibidores. Desta forma, recomenda-se a ingestão principalmente de carne juntamente a frutas cítricas e alimentos ricos em vitamina C e A. Deve-se evitar comer juntamente com a carne alimentos como: ovo, café, cereais, chá e verduras, alimentos ricos em cálcio (leite), soja. Alem disso recomenda-se aleitamento materno exclusivo até os 6 meses. Introdução dos alimentos anteriormente citados após este período.



Fortificação de alimentos: O Brasil adota como política nacional a fortificação da farinha de trigo e milho com ferro (4,2 mg/100g) e ácido fólico (150 ug/100g), entretanto, essa política atinge crianças maiores e mulheres em idade fértil, tendo em vista que habituamente os lactentes consomem pequena quantidade de farinha.

Suplementação medicamentosa:

Recomendações gerais: 1) realizar triagem (dosagem de Hb) em prematuros antes dos 6 meses e em bebes a termo entre 9 e 12 meses repetindo a cada 6 meses até os 2 anos e anualmente entre 2 e 5 anos, 2)no pré-natal  realizar suplementação com 60mg de Fe e 5mg de ácido fólico, caso a gestante seja deficiente em ferro a dose deverá ser de 120mg.

Tratamento: O objetivo do tratamento da anemia ferropriva é normalizar os níveis de hemoglobina, os outros indicadores hematimétricos e repor os estoques dos tecidos.
Para isso além da orientação nutricional adequada deve-se realizar a administração oral de sais de ferro (sulfato, citrato, gluconato, quelato, entre outros). A dose diáriade ferro elementar recomendada é de 3 a 5 mg/kg/dia, por um período em média de três a quatro meses ou até normalização dos níveis teciduais.



Diagnóstico diferencial:  O diagnóstico diferencial de anemia ferropriva deve ser feito com outras anemias hipocrômicas e microcíticas. Dentre elas, as mais importantes são referidas a seguir.
a) Talassemia minor e outras hemoglobinopatias, cujas alterações se farão evidentes na eletroforese de hemoglobina, presença de reticulose, etc;
b) Intoxicação crônica por chumbo, que se interfere na utilização do ferro e na síntese de hemoglobina, resultando em anemia microcítica e hipocrômica. Neste caso, podemos observar aumento dos níveis de porfirinas nas hemácias;
c) Pacientes com infecções crônicas (infecção, câncer, inflamação, doença renal) geralmente têm anemia do tipo normocítica normocrômica, porém 20 a 30% apresentam-se com anemia hipocrômica e microcítica. Nestes casos, a liberação do ferro pelo SER (sistema reticulo endotelial) está alterada, limitando a síntese de hemoglobina. A produção de eritropoietina geralmente é normal. Os reservatórios de ferro no SER e medula óssea estão aumentados;
d) Outros diagnósticos mais raros são a transferrinemia congênita (autossômica recessiva) e a anemia sideroblástica hereditária (ligada ao cromossomo X).


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